quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Adeus Irmãozinho.

Em um mundo onde tudo se troca por favores, você deu o exemplo e teve carinho por todos de forma indiscriminada e incondicional. O afeto verdadeiro e puro que você me deu, vou carregar por toda a minha vida e dá-lo de bom grado àqueles que encontrar pelo caminho. Seguirei seu exemplo na esperança de ver um mundo onde as pessoas possam amar da forma que você amou: Sem malícia, troca de favores ou julgamento. Se é possível surgir um vínculo tão profundo entre membros de espécies tão diferentes, como você demonstrou, então talvez haja esperança para a humanidade afinal de contas. Dante, seu cãozinho levado, você deixará saudades imensas.


sábado, 24 de outubro de 2009

É tudo uma gracinha, mesmo. A gente acaba até acreditando que os encarregados levam as coisas a sério. Os morros do rio estão há anos dominados pelo crime organizado, sob lei marcial de verdadeiros senhores feudais da cocaína, do crack e da heroína e agora que derrubaram um helicóptero e mataram três policiais, a polícia carioca está fazendo (ou dizendo que está fazendo) uma verdadeira caçada humana contra o cara que "deu a ordem" de derrubar a máquina. Como se isto fosse resolver os problemas das pessoas.

O problema do Rio é endêmico. Derrubar um cara não vai mudar o cenário, mas vai vingar os mortos. E é precisamente isto que os policiais estão fazendo, vingando os mortos. Eles não são muito melhores que os traficantes, apenas um pouco mais burocráticos. O problema de segurança pública do Rio de Janeiro já se tornou uma verdadeira guerra civil, com direito a bazuca e tudo o mais. Eu sinto muito se pareço um pouco exagerado, mas quando um grupo armado sitia uma parte do país e impõe sua lei acima da lei do estado, isto se parece com uma ocupação militar para mim. O crime organizado do Rio se tornou uma guerrilha, uma facção militar, um novo tipo de bandido que desafia a lógica de reinserção na comunidade. Para além do criminoso comum e seus motivos pessoais (por mais torpes que sejam), existe no Rio de Janeiro um soldado do crime organizado. O cara que monta guarda, patrulha, vigia e que tem ordens de matar.

O problema foi tão incrivelmente negligenciado ao longo do tempo que de um problema de segurança pública, evoluiu para o combate armado contra uma guerrilha que já provou o poder que tem. O poder paralelo dos narcotraficantes do Rio não encontrou limites sérios. Mas agora que mataram policiais, derrubaram um helicóptero e humilharam a polícia militar... Agora nós vemos ação policial. Como se nunca antes a favela tivesse precisado deste empenho todo. Muito bonitinho e companheiro da parte deles, mas eu não sou policial. E aí, o que a polícia vai fazer se eu for assassinado?

terça-feira, 2 de junho de 2009

Epístola de Saudades

Amada Ciência


Sinto muito por estarmos nos vendo tão pouco ultimamente. Desde aquele incidente com Galileo e depois Darwin, as pessoas simplesmente nunca mais foram as mesmas em direção a você. O que era para ser uma coisa tão simples tomou proporções muito grandes e destroçou pedaços de ego importantes. Sempre concordei com você, se quer saber... Mas você sabe que nestes dias difíceis, nem sempre é possível para um homem manifestar suas idéias e ser entendido sem um quê de julgamente e preconceito. As pessoas às vezes sentem mais medo irracional do que é saudável.

Peço que não se entristeça de lembrar de todas as vezes em que te expulsaram quando você estava quase voltando. Peço que se lembre como foi difícil conseguir o passaporte para você visitar a Europa com todo aquele negócio de foqueira. Tempos melhores hão de vir, como já vieram outras vezes.

Reconheço que parece egoísmo, mas gostaria que você me escrevesse mais vezes. Para contar como andam as coisas aí fora do país. Conte-me das suas visitas à Suíça e Áustria. Fiquei sabendo que teve coisa grande lá, mas só pela televisão. Queria ter ido para te ver pessoalmente, mas você sabe como é difícil fazer estas coisas sendo apenas um estudante.

Aqui pelo Brasil as coisas andam na mesma, com 'jeitinho'. Você sabe como funciona, não é? Às vezes aparece alguém com uma vista curta demais em um local importante demais e o pessoal não sabe como fazer pressão em cima do governo. Então está tudo meio que aos trancos e barrancos ainda. Só queria que reconhecessem como você é maravilhosa e finalmente te convidassem para voltar.

Gostaria muito de te ver pessoalmente, e me dói que você ainda seja tão mal-compreendida. Justo você, que revelou tantas coisas maravilhosas. Que me ensinou tanto, em uma época em que ensino era justamente o que eu precisava. Queria não ter aprendido por correspondência, queria ter vivido ao seu lado, sentido seu perfume. Bom... Sou-lhe grato eternamente pelas pérolas que você me deu quando garoto, na esperança que eu lhes descobrisse o valor quando fosse mais velho.

Estou tão ansioso. Não é que eu não goste das cartas. Mas há certas coisas que só dois pares de braços e um beijo podem dizer. E isso vai além de algumas palavras.

Com amor

Gabriel

sexta-feira, 6 de março de 2009

Moralidade

Existe uma crença geral, praticamente um dogma, que a moralidade como concebida por nós tem um tipo de ligação muito forte com a crença em uma força mística do bem que castiga severamente aqueles que se desviam de suas leis. E que por este motivo as pessoas que não acreditam neste misterioso (e indetectável) poder não podem desenvolver um tipo congruente de ética.

Eu prefiro deixar que atos falem por palavras. Dia 27 de Fevereiro de 2009 uma menina de 9 anos, grávida de gêmeos e vítima de estupro do padrasto deu entrada no Instituto Materno-Infantil de Pernambuco. Os profissionais responsáveis classificaram a gestação como sendo de alto risco e realizaram a única opção lógica para salvar a vida da criança: abortaram a gravidez. Na quarta-feira, dia 4 de Março, O bispo de Recife e Olinda, dom José Cardoso Sobrino, estarrecido por este crime hediondo, excomunhou a mãe da menina, a menina, e todos os profissionais da equipe que realizou o procedimento. Segundo ele, não importava se a menina ia morrer, ser vítima de profundas seqüelas psicológicas, e jamais teria condições de criar os gêmeos. O que importava para ele, é que o aborto é um crime no direito canônico. Que a lei dos homens, quando contrarai a lei de deus, está errada.

É impressionante a inflexibilidade, inabilidade de capturar o contexto e sobretudo a completa falta de sensibilidade e capacidade de julgamento. A ironia é incrivelmente sórdida, vinda de uma instituição que fala de moral e ética como seus principais pilares. É concebível, dentro da ética, deixar uma criança de 9 anos, estuprada pelo padastro, à mercê da morte ou de seqüelas físicas e psicológicas indeléveis? É um discurso tão porco que só de lê-lo nas manchetes já me enche de nojo. Se é este tipo de ética que a Igreja prega difundir, então muito obrigado mas eu não quero. Minha ética me diz que o procedimento foi correto, e que foi para o melhor. Na minha ética, leis idiotas promulgadas por um ser imaginário e defendidas por uma corja de velhos safados e hipócritas não vale a qualidade de uma vida humana. Na ética que eu aprendi na univesidade, na vida e na escola a qualidade e o valor da vida humana valem mais que qualquer deus. A igreja aparentemente está aqui para defender deus, eu estou aqui a serviço da humanidade.

E para completar ainda mais o quadro já ridículo e asqueroso, o padrasto que estuprava a menina desde os 6 anos e também molestou a outra enteada, de 14 anos e deficiente física, não vai ser excomungado. Acho que se ele tivesse usado camisinha teria sido. Eu prefiro não ser associado com canalhas como esse distinto bispo supracitado. Eu estou do lado da criança, não de deus.

Referências:

> http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1029966-5598,00.html

> http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI3606841-EI5030,00.html

> http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,menina-de-nove-anos-que-fez-aborto-tem-alta-no-recife,334751,0.htm

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

O Fim da Festa

Terminando, está terminando. Finalmente em Março eu consigo o papel que diz que eu sou farmacêutico. E aí? Bem, e aí não sei mais. Todas as pessoas com quem comento isto parecem incrivelmente empolgadas, como se fosse uma grande conquista, uma vitória decisiva, praticamente um orgasmo intelectual. Eu não vejo as coisas desta forma. Para mim é como um longo e caudaloso rio, morosamente se aproximando do ponto onde a canoa quer descer. Dizer que é tudo que eu sempre sonhei e que é uma grande vitória e nhé-nhé-nhé seria mentir para mim mesmo. Uma grande vitória pra mim foi ter completado um ano de namoro com Isabelle, ou ter conseguido uma nova bolsa e entrado de cabeça em um campo de estudo que sempre me interessou. Isso sim são grandes desafios, que me deu muito prazer conquistar. Mas não o diploma.

Não foi tão difícil. Na verdade, esse diploma é apenas o final de uma escalada constante e nada impressionante. Um final incrivelmente previsível para uma trajetória previamente planejada. Não há nada intrinsicamente impressionante sobre isto. Acho que é a conclusão que tinha que ser. Quase meia década de estudo programado. Às vezes maçante, às vezes levado aos últimos limites da mecanicidade apenas pelo maldito respeito cego aos protocolos. Sinceramente, aprendi muito, mas decepcionei muito mais. Glorificar o diploma seria glorificar minha suposta "aderência" aos padrões de educação do sistema que eu enfrentei, e eu não quero fazer isto. Respeito que agora me considerarão farmacêutico oficialmente, mas esse não era o plano. O caminho que se estende agora é muito mais impressionante e instigante. Não vejo a hora de me dedicar às minhas pesquisas, mas as malditas horas-aula ainda me cobram o ônus do tempo. Pra quê? Com que sentido? O que mais eu vou aprender agora? Com todo o respeito, nada, eu garanto. Não tenho mais saco para isso. Já chega, deixem eu me formar e tocar com a minha vida. Ao invés de me deixarem crescer, permaneço enfurnado em uma sala de aula, dia após dia, só desejando que se acabe. É um pouco a sensação de quem é obrigado a ficar na sala do cinema para assistir os créditos dos filmes só porque jurou assistir o filme "todo".

Estou feliz de está me formando. Mas isso não tem nada a ver com o fato de estar me formando. Apenas com o fato de que agora eu vou poder me dedicar aos planos realmente interessantes que exigiam que eu estivesse formado. Estou empolgado com o futuro e com as possibilidades que aparecem na minha frente. O horizonte é brilhante e promete muitas coisas boas... Mas vou ter que agüentar as inócuas aulas finais até Março. Vai entender a cabeça das pessoas que montaram essa zorra toda.

O quê?

O que aconteceu? Eu não entendi, sério. Num minuto estava tudo tão bem quanto se pode estar no dia da despedida, você estava até dançando, e de repente o tempo fecha e tudo se descarrilha. Até agora estou me sentindo confuso, doente e (curiosamente?) arrependido. Lembro da dança sexy em que você estava agitando seu corpo delicioso no ar, suas formas perfeitas se contorcendo e se expandindo bem na minha frente, e eu lá extasiado, querendo me juntar a você. Dos momentos engraçados sob as cobertas e sobre as cobertas. Lembro com alegria dos momentos de aperto, quando não deu para fazer mais nada exceto dar de ombros e dizer "É isso aí... Mas eu te amo e tá tudo bem!". Você consegue se lembrar? Porque para cada segundinho pequeno que eu espremi desse final-de-semana, tenho uma recordação acalentadora para aquecer o coração saudoso.

Mas quando lembro das últimas horinhas, do último dia, não sei o que aconteceu. É simplesmente um turbilhão estranho e confuso. Lembro do seu sorriso, da agitação da insônia da madrugada, lembro de você acordando, pedindo para eu desligar o ventilador, depois pedindo para ligar... Mas depois de certo ponto, lembro de você quieta, silenciosa, com o semblante carregado. Lembro de você cruzando a rua sem esperar por mim, da cabeça doendo sob o Sol e de um olhar severo no seu rosto. Suas mãos não mais tentando alcançar as minhas e a vontade de falar algo, mas sem saber o quê. São lembranças fortes, se quer saber... Mas talvez você não queira saber. Cheguei em casa confuso, doente, com saudades, tristonho e magoado e não sei a causa de metade disto tudo. Eu achava que tinha dado tudo certo. Talvez eu simplesmente não te entenda tão bem quanto eu achava que te entendia. Me explica?

terça-feira, 17 de junho de 2008

Ignorância e Lobos

Estamos vivendo em uma era de muitas transformações, infelizmente, nem todas estas transformações são coisas boas. Apesar de acreditar no lema "Em matéria de ignorância, espere qualquer coisa das pessoas", eu me espanto diariamente com bárbaras demonstrações de cegueira lógica. É impressionante ver quantas pessoas desconhecem o funcionamento da ciência moderna, ou mesmo opõe-se a ela como se fosse algo diabólico. E não me refiro a conhecimento técnico da área, mas aos fundamentos básicos sobre como o conhecimento científico é obtido, testado, retestado e finalmente descartado, sendo substituído por algo mais preciso, no círculo virtuoso dos grupos de pesquisa.

Esses fundamentos não são exclusivos da ciência, são as bases para o pensamento crítico e o ceticismo saudável de pessoas que não deveriam acreditar apenas ao ouvir ou ver, mas analisar e filtrar as informações que chegam. Este tipo de posicionamento está se tornando raro. As pessoas estão perdendo a noção de como a ciência funciona. Justo a ciência, uma atividade que nasceu no próprio seio da necessidade e curiosidade humana. O motor que nos mantém em movimento, a linha que nos separa das feras, o pilar que sustenta nossa civilização.

Ciência é um direito (pode procurar na declaração universal) de todo ser humano e deveria ser amplamente divulgada. Ao invés disso, muitas pessoas desvirtuam e distorcem as informações, sem sequer verificar se sabem realmente sobre o que estão falando e sem calcular as conseqüências. Espalhar informação falsa sobre a ciência é um assunto muito sério. Além de vasta compreensão sobre o funcionamento do mundo onde vivemos, dos limites de nosso pensamento e de nós mesmos, a ciência nos deu ainda medicamentos, cirurgias, carros, aviões, seringas, celulares, aparelhos médico-hospitalares, óculos, próteses, calçamentos, saneamento básico e um leque imenso de coisas e conceitos que ajudaram a tornar nosso estilo de vida cada vez melhor.

Quem quer que insinue que a vida na idade média era melhor que hoje, certamente não faz idéia do que está falando. Difamar a ciência é fazer as pessoas perderem confiança em um conhecimento que tirou o mundo das trevas, logo depois da idade média. É negar tudo aquilo que a ciência descobriu e construiu. Quando a sociedade caça e desfaz a ciência, ela retarda o rítimo até parar. Se isso acontecer, eu gostaria muito de ver como nos sairíamos contra os lobos que certamente deixariam de temer nossas armas, casas, cercas, carros e tudo aquilo que nos distancia da selvageria do mundo natural. Não adianta rezar enquanto se é destroçado por uma matilha de cães famintos.